Sobre Artes (Explicar X Explorar)

clich
Sim, ele de novo! O crítico de arte cult

Recentemente eu comecei a ver um canal no youtube e acabei viciado nele, NerdWriter. E acho que a abordagem dos vídeos resume minha experiência, em geral a ideia é de exploração de alguma temática. Não é explicando tal temática, não é “mostrando o significado oculto”. Explorando

Apesar de eu adorar simbolismos e referências em todo tipo de arte, a abordagem usual de blogs, canais e principalmente críticos me fez perder MUITO do ânimo com isso. Como assim? Aqui e aqui tem algumas postagens sobre, mas é a história clássica: “O que? Você OUSA não gostar de Machado de Assis? É porque você não é culto o suficiente, você não entendeu que quando ele cita “cortinas azuis” isso é um simbolismo para as amarguras da vida humana presa em um ciclo eterno de repetição como disse Kant em seu livro a República durante a primeira fase da revolução proletária na Rússia.” A grande maioria da crítica artística, como ja bem citou C.S. Lewis em sua análise bem humorada ao meio, vem focando cada vez mais no ego do crítico. “Ler” uma obra deixa de se focar no artista ou na obra, e passa a ter como objetivo a auto exaltação. Mostrar a todo mundo o quão cult e inteligente você é ao notar sutilezas que ninguém, incluindo o autor, notou. O que sempre me lembra a historia do colega de literatura que via em rei leão uma “clara” simbologia ao domínio americano às suas “colônias” africanas (Zazu é o conselheiro do rei Mufassa e é azul, obviamente ele simboliza os EUA aconselhando potências africanas etc etc wiskas sache). Enfim voltando ao foco.

hqdefault
Venda seus metais preciosos Mufassaaaaaa

Na contra mão disso, esses vídeos, junto com alguns outros como o 8-bit Phylosophy, tentam justamente explorar as obras, e não explicar elas ao espectador, como se uma obra de arte possuísse somente uma interpretação correta. E com isso conseguem de um jeito infinitamente mais humilde tecer uma narrativa sobre os simbolismos e recursos que poderiam significar algo. Particularmente o vídeo sobre como Howard Shore cria uma segunda narrativa em senhor dos anéis somente através da trilha sonora é um dos mais fascinantes e sutis por exemplo. Eu já comentei sobre esse vídeo em especial em postagens antigas então não vou ficar martelando o ponto, mas é fascinante ver que realmente os temas (Leitmotifs) da comitiva do anel vão sendo tocados por cada vez mais instrumentos conforme novos membros se juntam, e somente no conselho de Valfenda após a união de todos os membros que o tema será tocado em toda sua plenitude (e ainda mais legal ver como ele perde instrumentos e intensidade após a morte de Gandalf).

hqdefault (1)
Veja o vídeo do NerdWriter, serião

E note que eu não concordo com boa parte dos simbolismos. Muitas vezes esses canais citam coisas que, pelo menos para mim, são claras viagens. Eu não acho que os criadores de “Bee Movie, a história de uma abelha” estivessem fazendo uma crítica ao modo de produtividade do capitalismo. Mas ai que está a coisa fascinante desse tipo de critica não afetada. É ok, discordar. Você não é “menos cult” ou ignorante por discordar da interpretação pessoal do crítico nesse tipo de narrativa. Afinal ele esta explorando o que pode ser simbolismo, e não te explicando do alto de seu diploma o porque o alienista é objetivamente bom e quem não gosta é burro. E através disso, fica infinitamente mais fácil introduzir pessoas “não iniciadas” nesse universo fantástico da análise artística de obras. Ver como o enquadramento e iluminação de um filme podem transmitir um segunda narrativa, prestar atenção em como os instrumentos transmitem algo além dos sentimentos mais evidentes, etc. Toca um pouco na questão de sinestesia que discuti aqui. Como o conhecimento de outras áreas somente adiciona a experiência de analisar algo.

E aqui entramos justamente no cerne disso, como apresentar sua visão ao outro. Numa postagem a algum tempo atrás  falei sobre como era irritante a mania de certos professores de menosprezarem a visão filosófica e ideias dos alunos. E o ponto de narrativas que “exploram” ao invés de “explicar” certas obras toca esse ponto. É infinitamente mais fácil interessar alguém por alguma obra ou um tipo de arte ao se explorar e analisar a coisa junto da pessoa. E é muito mais fácil fazer alguém pegar birra infinita de toda uma área ao se apresentar aquelas obras como algo inerentemente bom, e que qualquer um que não goste é porque não entendeu a mensagem oculta da coisa. Ou seja, explore mais, explique menAs.

aaa
Mito

E fechando com chave de ouro, um dos últimos vídeos do Wisecrack explorando a temática recorrente dos maravilhosos filmes de Hayao Miyazaki, e sua conexão com o  Shintô:

 

2 comentários

  1. É completamente errado afirmar que o gosto de uma pessoa advém de uma ideia de falta de cultura ou por não entendimento. Você pode – e deve – gostar de coisas que lhe agradem, a ideia da arte é essa: primariamente servir como entretenimento.

    Porém, não é correto afirmar que, por exemplo, Machado de Assis é tecnicamente ruim. Ele não é. Você, contudo, pode afirmar que Machado de Assis não lhe agrada, e isso é perfeitamente normal e aceito (por quem não tem problemas de ego).

    Entretanto, se você faz juízo artístico de alguma obra, tecnicamente falando, vai ser preciso embasar a sua análise crítica (ora, a crítica é feita assim quando séria) senão é apenas uma opinião subjetiva que não tem valor crítico nenhum.

    Interpretações, simbolismos e busca por significado oculto não são críticas técnicas são opiniões embasadas pela visão de mundo da pessoa e pelo seu viés ideológico (como você cita o seu colega que ignora que Rei Leão é uma colagem de MacBeth e Hamlet [com algumas passagens bíblicas] para imaginar que se trata de uma analogia ao imperialismo americano dentro da África).

    É importante diferenciar a crítica técnica (sobre trama, personagens, motivações e escrita) da interpretações pessoal dos elementos narrativos de cada obra. Uma coisa não tem, necessariamente, relação direta com a outra.

    Curtido por 1 pessoa

Deixe um comentário